O ato de vestir-me todos os
dias é um ato de saturação mental. Não consigo compreender como alguém pode ter
prazer em passar horas diante de um espelho a experimentar esta ou aquela peça.
Isso enerva-me de tal modo que, sem apoio, seria capaz de rasgar tudo o que
estivesse a provar.
Para mim, o óbvio é olhar para
o guarda-roupa e vestir-me pensando apenas no básico: uma boa combinação de
cores. Sempre primando pela discrição. O ser discreto é fundamental para não
ser alvo de olhares menos bons. Creio que, se desejamos ser “espampanantes” no
vestir, devemos fazê-lo no Carnaval. Período do ano em que podemos passar por
“pessoas divertidas”. Quer dizer… por favor, não me interpretem mal, afinal,
garanto-vos que sou uma pessoa divertida, mas creio que isso só se percebe num
jantar, rodeado daqueles que amo e, naturalmente, com um tinto de qualidade a
“molhar a goela”.
Lembro-me, com uma certa
saudade, das calças “boca-de-sino” dos anos setenta no, logo longínquo, século
XX. Lembro-me muito bem, aliás. Bem como daquelas camisas com padrões
coloridos, réstia de sóis dos hippies dos anos sessenta. Bons tempos. Hoje acho
graça. E, fico a matutar, muitas vezes, se ousaria repetir aqueles figurinos.
Nos anos oitenta passei a usar
um estilo anos cinquenta: calças jeans, t-shirt branca, casaco de couro preto,
sapatos “bico-fino”. As garotas adoravam e eu sentia-me o Elvis, o Brando, ou o
Dean.
Nos noventa, com muito teatro e
literatura cabeça dentro, vestia-me como um hippie dos anos sessenta. Ah…
Garanto-vos que tomava banho, uma das minhas grandes predileções, ao contrário
dos “garotos do Iê-iê-iê”, que tinham “fama de maus”, e o banho era coisa
estranha para eles.
Entrou a primeira década deste
novo século e passei ao estilo: “querida, o que vou vestir?”.
Na segunda década, acusam-me de
não ter desenvolvido um estilo próprio na vestimenta. Enganam-se, pois “a minha
alma” continua com calças jeans, t-shirt branca, casaco de couro preto e
sapatos “bico-fino”. Já a casca, bom, essa, coitada, deseja mesmo um calção de
banho e o último modelo de uma famosa marca brasileira de chinelos.
Aí está o
que vou fazer da moda. Ou, não me digam que vivendo numa praia paradisíaca o
meu figurino não estará adequado?
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