No
ano de 1933, a cidade de Atenas, na Grécia, foi palco do IV CIAM - Congresso
Internacional de Arquitetura Moderna, dali resultando um manifesto urbanístico conhecido
como “Carta de Atenas”.
Os
Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna (1928, 1929, 1930, 1933, 1937,
1947, 1949, 1951, 1953 e 1956) criaram uma estrutura de pensamento e
desenvolveram uma sucessão de episódios, amparados pelos principais nomes da
época, no intuito de discutir quais os métodos a adotar nos mais diversos
âmbitos da arquitetura.
Os
congressistas expuseram e debateram sobre os mais variados temas e foram os
impulsionadores daquilo que se conhece como international
style, uma arquitetura depurada, substanciada, prática e lógica, e que, em
minha modesta opinião, veio prejudicar grandemente o património histórico de
diversas cidades, inclusive o de Caldas da Rainha.
Caldas
da Rainha é uma urbe - talvez a única de Portugal - a possuir uma diegese das mais
distintas, compreendendo exemplos arquitetónicos desde 1500 até à atualidade, porém,
faltando-lhe o mais importante: Tratar cada edificação (independente da época
de sua construção) como uma preciosidade, cuidando dela e preservando-a como
merece.
Se
cada um daqueles Congressos reconhecia a arquitetura e o urbanismo como latentes
meios políticos e económicos, devendo ser adotados pelo poder público, como
forma de estimular a evolução social, vou mais longe e afirmo que devemos
também reconhece-los como impulsionadores culturais, o que me parece que não
ocorreu.
Claro
que é necessário “pensar a cidade”, considerando-a, como diz Le Corbusier (1887-1965),
autor da “Carta de Atenas”, um “organismo a ser delineado de modo funcional e
centralmente planeado, na qual as necessidades do homem devem estar claramente
colocadas e resolvidas”, porém, ao “pensar a cidade”, devemos considerar também
a conservação de todo o seu património histórico edificado, mantendo-o, e não o
derrubando.
Como
é amplamente visível, muitos erros arquitetónicos foram cometidos em Caldas da
Rainha, cito apenas três: 1) A ambição de ganho fácil, por parte de alguns
construtores (com a classe política a ser conivente, sabe-se lá porquê), 2) O
desconhecimento da Câmara Municipal acerca dos mecanismos de preservação do
património histórico, 3) A ignorância, também do setor público, em relação à
existência de documentos, e eventos, fundamentais, relacionados com o
desenvolvimento da arquitetura.
A
“Carta de Atenas” sofre de alguns males, e foi a culpada por diversos crimes,
veja-se o caso da demolição do Palácio Monroe (Palácio de Saint-Louis), no Rio
de Janeiro, em 1976, pelo arquiteto Lúcio Costa (1902-1998), responsável pelo
Plano Piloto de Brasília, bem como da indecente derrocada da qualidade da tessitura
urbana (o encadeamento entre as partes do seu todo) de Caldas da Rainha, a
partir do ano de 1980.
Este
concelho sofre de monotonia urbana, com um acentuado desrespeito pela beleza
arquitetónica anterior ao ano de 1933 e, para piorar, continua a fornecer
incentivos ao investimento nos “espaços-de-ninguém”, tornando a cidade num
local sem personalidade, com fraco bem-estar social (imperfeições também
previstas na “Carta de Atenas”).
Há
solução para a arquitetura das Caldas da Rainha? Sim, existem dois caminhos a
seguir: Demolir tudo o que desgraça a sua individualidade (por exemplo: Os
“mamarrachos da Praça da Fruta”) ou investir na Acupuntura Urbana, uma conceção
do arquiteto Marco Casagrande, natural da Finlândia, que emprega a ideia de
pequenas intervenções, aliadas a uma teoria de ecologia urbana. O melhor
exemplo desse conceito é a cidade de Curitiba, no Brasil, cujo respeito pela
História, pelos grandes valores locais, pelo desenvolvimento sustentável e pelo
planeamento organizado, melhoraram-na, em muito, e ajudariam a resolver os
problemas mais gritantes de uma cidade como a das Caldas da Rainha, que foi tão
vilipendiada na sua personalidade arquitetónica com o correr das décadas.
É
necessário voltar a atenção à sustentabilidade, à tolerância à sociodiversidade
e à mobilidade, para isso, convém eliminar o que é tóxico à cidade, tornando-a,
assim, mais humanizada, mais complacente, mais harmoniosa.
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