Rezam as crónicas familiares de
que o meu bisavô Francisco Calisto construíra um arco de volta perfeita, em
pedra, nas suas terras em A-da-Gorda.
Sem nenhum conhecimento
arquitetónico, mas, com um extremo sentido estético, centrou a sua edificação
no respeito pelos desígnios do Grande Arquiteto, depois de ter diante de si
alguns ensinamentos antigos, que lhe povoaram a mente de diversos valores
morais.
O arco de volta perfeita era o
culminar de uma vedação unificada, toda ela de acácias, uma exótica planta de
origem australiana que foi introduzida em Portugal, pela mão do homem, em
meados do século XIX.
Devido à sua riqueza
ornamental, Francisco, achou por bem plantar a “Acácia dealbata”, como linha
divisória, ao redor de suas terras. Depois de alguns anos, deixou de ser apenas
para adorno, mas, também, para fornecimento de matéria-prima, passando a vender
a casca para a indústria dos curtumes, tanto de Guimarães, quanto do Porto e de
Alcanena, regiões que recebiam, também, outro bom insumo, neste caso, cascas de
carvalho, oriundas das abundantes árvores das serras altas de Fafe.
A semeadura da acácia teve
também outros significados, mais relacionados com a segurança, a clareza, a
inocência e a pureza, para total consagração da alma, afinal, não eram apenas
os hebreus, os detentores desse conhecimento, um modesto agricultor português
também o possuía.
A acácia simbolizava, no
entender de Francisco, a sua reaparição numa época vindoura, em outro corpo,
mas com a mesma alma, portanto, seria necessário uma valiosa dedicação ao
cultivo e tratamento daquela planta. Como seria, também, importante, a
construção de uma entrada robusta, com carisma, e que afirmasse o grande valor
da Pedra.
E, assim, surgiu o arco de
volta perfeita, sendo a sua chave, ou aduela central, muito simples, sem os
adornos que os grandes monumentos possuem, afinal, como explanei anteriormente,
Francisco não era arquiteto, o que significava que a sua preocupação era
funcional, e não estética.
O bom homem utilizou pequenos
blocos retangulares e as juntas entre eles não apresentavam descontinuidades. O
seu construtor, provavelmente, não tinha noção de que esse tipo de arcada
irrompera na Mesopotâmia, no terceiro milénio a. C., e, posteriormente, nas
arquiteturas Etrusca e Romana, prosseguindo depois para toda a Europa, sendo,
inclusive, muitíssimo empregado na Arte Renascentista.
Francisco era um homem
telúrico, possuindo um amor profundo pelo solo que cultivava, além de ter um
espírito carregado de entusiasmo e alegria, e uma força anímica repleta de
energia e dinamismo. Reconhecendo o seu papel no globo terrestre – sem ter a
noção exata do que o compunha – tinha a perceção nata de que os seus atos
poderiam influenciar a sua comunidade: Se praticasse o Mal, o ampliaria. Se
praticasse o Bem, o propagaria. Logo, vedar a sua terra com acácias amarelas –
para além da conexão com o Grande Arquiteto – levaria aos olhos dos outros uma
singela mensagem de Amor.
O arco em volta perfeita em
pedra era, simplesmente, o culminar de uma mensagem subliminar, que a sua alma,
tocada pelo Alto, deixaria para a Humanidade. Como se, quem por ali passasse,
fosse, de algum modo, tocado no coração.
Havia, naquela arcada, uma
inscrição em duas letras: E.O.
Sob a Luz da “Estrela do
Oriente” afirmo, entre alguma comoção, que uma das pedras do arco de volta
perfeita em pedra ainda existe. Repousa, num local seguro, longe das
intempéries e da ferocidade da índole humana.
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Ilustração: Estela Calisto (10 anos de idade).
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