Como é do conhecimento público sou ideologicamente de Esquerda, porém, recentemente, um grande amigo, cujo ideal político assenta na Direita, disse-me que achava curioso o facto de, sendo eu uma pessoa com essa tendência política, possuir na minha biblioteca um volume tão grande de publicações de e sobre o Dr. António de Oliveira Salazar (1889-1970).
Atualmente, especialmente pelas
redes sociais, deparamo-nos com comentários francamente alienados acerca da
atual conjuntura política portuguesa. É graças a esse alheamento que surgem os
partidos de Extrema-Direita. Infelizmente, uma absurda quantidade de pessoas
passa a identificar-se com eles, movidas que são por palavras/frases de efeito,
daquelas que ecoam lindamente em ouvidos pouco atentos.
Se separarmos o político do
escritor, percebemos que o Dr. António de Oliveira Salazar possuía uma curiosa
qualidade intelectual, que o levou a escrever textos literariamente
interessantes. Esse é um dos pontos que me impele a ler a sua produção.
Se não executarmos essa
separação, e exercitarmos espontaneamente uma leitura atenta acerca do seu modo
de governação, percebemos que jamais nos poderíamos alinhar com as suas ideias
políticas.
Quando ingressou na
Universidade de Coimbra, onde se especializaria em economia e finanças,
destacou-se desde o primeiro momento devido aos seus escritos em jornais
católicos de província. Frases que ecoaram na Capital, fazendo com que a sua
carreira fosse acompanhada de perto pelos dirigentes políticos de então. Espartana,
muito prudente e habilíssima no jogo político, essa personagem, segundo Tom Gerard
Philip Gallagher (1954-) “mantém-se uma figura tão controversa como enigmática,
cujo conservadorismo e um legado autoritário continua a dividir as opiniões. De
um lado, os que consideram que o seu reacionarismo e opressão promoveram o
atraso do país, do outro os que glorificam o seu patriotismo, honestidade e
dedicação”.
O Dr. António de Oliveira
Salazar foi profundamente influenciado pela Action Française, um perigoso
movimento contrarrevolucionário monarquista e orleanista francês, onde
pontificaram, por exemplo, Charles-Marie-Photius Maurras (1868-1952), Maurice
Barrès (1862-1923) e Gustave Le Bon (1841-1931). Entre 1910 e 1926, Portugal
não conseguiu manter um governo que conseguisse “conduzir os destinos da
nação”, e é devido a isso que, nesse último ano, uma fação militar desfechou um
golpe de Estado. Devido ao destaque de seu pensamento político na imprensa, foi,
então, chamado para assumir o Ministério das Finanças, sendo, posteriormente,
nomeado presidente do Conselho de Ministros em junho de 1932.
O momento era extremamente
delicado devido ao número de ditadores que, nos anos 30 do século XX,
utilizaram um violento componente de manipulação de massas (o anúncio de uma
conspiração mundial judaico-comunista) tendente ao crescimento de ideais nacionalistas, que fomentou na mente, do
político português em questão, uma necessidade suprema de impedir, a qualquer
custo, que “os comunistas viessem por aí abaixo, tomando a Europa e por tabela,
este pequeno país à beira mar plantado”.
Conhecer a obra
de e sobre o Dr. António de Oliveira Salazar, permite-me ter condição de
discordar dos pensamentos de Extrema-Direita, ou mesmo de apoiar, ou de fazer
alianças e coligações com Partidos políticos que se venham a reger por essa
cartilha.
Se deixarmos a
História conduzir as nossas ações, esmiuçando as suas personagens políticas mais
relevantes, com toda a naturalidade, podemos pugnar por um país melhor. É na
leitura, possuindo o cuidado de perscrutar, de estudar, de avaliar, as gêneses
políticas que conduziram (e conduzem) as nações, que evitamos dar voz a
políticos extremistas, que anunciam medidas dramáticas, especialmente contra os
Direitos Humanos, para salvar a economia. Quando o que deve ser salvo, em todos
os quadrantes da Terra, é o ser humano.
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