Todos os dias, no intervalo da
manhã, entre a escrita de um artigo para um jornal ou um trecho do capítulo do
novo livro, coloco os pés na rua e faço uma pausa consoladora. Geralmente dou
uma caminhada de trinta minutos, mas também posso sentar-me numa esplanada,
conversar com um amigo que acabo de encontrar, ler um pouco ou, simplesmente,
auscultar o entorno, tentando perceber os achaques das personagens que povoam
certas regiões da cidade onde estou no momento. Sim, sintam-se observados.
Há diferenças gritantes, no que
toca ao assunto que cada tipo de pessoa, que frequenta aqueles recintos,
aborda. Se estivermos em Londres podemos ouvir encómios à nova obra pictórica,
escultórica, etc., adquirida pelo Museu Britânico, se o caso se der na capital
da Áustria, inevitavelmente seremos abençoados com detalhes da recente estreia
na Ópera Estatal de Viena, se for em Lisboa ou no Porto ouvimos os mais
diversos assuntos, se as bocas que os proferem forem estrangeiras, porém, se
forem portuguesas a pauta do momento será relacionada ao “futebolês”,
especialmente o que impacta os “três grandes”, conquanto, pode dar-se o caso de
captarmos um comentário ácido acerca da política do momento, ou sobre o mais
recente “escândalo” do meio financeiro do país.
Na província (perdoem-me por
usar este termo tão característico do Estado Novo) os temas não são muito
diferentes. O que se percebe, e de um modo maciço, é o culto à bola, contudo, e
no caso específico de Caldas da Rainha, além da preocupação com o esférico, os
assuntos em voga giram em torno de duas apostas: “Quando ocorrerá a queda do
Governo?”, e “será que este novo quadro camarário consegue resistir quatro
anos?”.
Preocupa-me, de facto, que,
entre mesas de um qualquer estabelecimento, exista (acerca da nova equipa que
está a gerir a Câmara Municipal) esse tipo de incerteza. Por aquilo que pude inquirir,
o mote para a desconfiança assenta no facto da nova estrutura possuir
indivíduos das mais diversas bases ideológicas, bem como a presença de egos
muito acentuados e pouco dispostos a “ouvir o outro”.
Pela parte que me toca,
acredito que o mandato pode ser bom, se existir coragem para assumir um
afastamento completo da política aplicada pelo executivo cessante (se não o
fizerem, inevitavelmente, daqui a quatro anos o PSD regressará ao poder, e
muito mais fortalecido), sendo necessário, também, uma aproximação à população,
através de soluções reais para os problemas comuns (e não no “investimento” em
festarolas e bimbalhadas).
As conversas de café apontam
para diversas direções: vias públicas imundas; obras paradas; receio de que
existam interesses particulares a sobreporem-se aos do concelho; facilitismos
aos “amigalhaços” para chegarem aos apoios municipais; que propostas podem ser
elaboradas para melhorar o território e concorrer para a qualidade de vida da
população; quais os programas para a configuração económica da região; qual o
projeto para benefício do comércio local, qual a proposição para a renovação e
investimento na Zona Industrial; quais os apoios para o setor cultural (o que
fazer com o CCC e com os museus municipais, por exemplo); qual o projeto para a
recuperação do Hospital Termal; etc..
Evidentemente, o primeiro ano
do mandato será de averiguação, para que se possa entender qual a dimensão e os
impactos resultantes de gestões anteriores, porém, se, desde já, não existir
mudança de comportamento nas políticas a seguir, inevitavelmente, o novo
executivo terá um rosto comum, sendo facilmente identificado como
“continuador”, o que será “uma pedra no sapato” do eleitor que exigiu mudança.
Para já devemos deixar que o
tempo se encarregue de mostrar o que se vai passar. Com as cobranças normais
que se devem fazer a todos os autarcas, baseadas no respeito e no decoro.
Levar um livro para uma
esplanada ajuda na conversa de café. Torna-a mais qualitativa e, quem sabe,
mais eficaz na elaboração de uma crítica construtiva, evitando que se procurem
esqueletos dentro dos armários.
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