Avançar para o conteúdo principal

Demagogia ou Eurocentrismo?

 



Utilizando o meu direito à liberdade de expressão, ouso comentar o apoio que a vereadora da ação social das Caldas da Rainha decidiu dar aos possíveis refugiados ucranianos que possam chegar ao concelho: É um ato louvável.

Porém, faço a seguinte pergunta: O “Gabinete de Crise para Refugiados” agora criado, serve apenas para o extraordinário povo ucraniano ou podemos incluir, também, as populações que fogem dos outros graves conflitos que acontecem no nosso planeta (bem como a colónia russa, que tem sido alvo de claro preconceito no concelho caldense)?

Com certeza a Sra. vereadora não sabe, mas existem vinte e oito atrozes conflagrações a ocorrer no globo terrestre, entre elas: O conflito curdo-turco; a segunda guerra civil no Iraque; a guerra contra o narcotráfico no México; a guerra civil da Somália; a insurgência islâmica no Magrebe; o conflito na Caxemira; a guerra do Afeganistão; a guerra civil na Síria; a guerra civil iemenita; o conflito no sul da Arábia Saudita; a guerra em Donbass (na própria Ucrânia); etc.. São milhares os mortos contabilizados desde o início desses combates, além de uma quantidade absurda de pessoas a tentarem abrigo em outros países. Se a Sra. vereadora da ação social não está a investir em demagogia, não seria, então, mais correto, disponibilizar o “Gabinete de Crise para Refugiados” (e demais promessas de apoio) para os milhares de desabrigados em África, Ásia, Rússia, etc. e não apenas para os ucranianos?

Outra questão que me incomoda: Se a Sra. vereadora assume empenho perante os possíveis refugiados (da Ucrânia) que cheguem às Caldas da Rainha, porquê não retira das ruas do centro, das imediações do quartel e do Parque D. Carlos I, as pessoas que ali pernoitam por não terem abrigo? Não vale usar a desculpa esfarrapada: “Eles não querem sair das ruas”, pois é a maior das tolices que se pode dizer.

Nos jornais caldenses, acerca do “Gabinete de Crise para Refugiados”, a Sra. vereadora da ação social, anuncia que: “a expetativa é de que possam chegar 300 refugiados (…) a estrutura irá coordenar as ações municipais em articulação com os atores locais e nacionais. Esta plataforma de interação permitirá prestar “informações sobre a forma como irá ser feita a regularização destes cidadãos e fazer chegar aos centros de empregos as suas competências para poderem ser integrados no mercado de trabalho…”. Muito bem, então quer dizer que os desgraçados (portugueses, na sua maioria) que perambulam pelas Caldas da Rainha, dia e noite, também terão esses direitos? Creio que são casos muito simples de resolver, pois são poucos, no máximo vinte.

Gostei, particularmente, de outra promessa que a Sra. vereadora da ação social ditou para os jornalistas presentes na conferência de imprensa do recente dia 4 de março: “…E estamos a tentar apurar junto de outras entidades e pessoas que tenham espaços disponíveis que possam, de algum modo, integrar uma bolsa municipal para acolher as pessoas que chegam”. É caso para perguntar: A Sra. vereadora da ação social vai disponibilizar algum quarto em sua casa? Se isso se concretizasse, sairia do campo demagógico para o da santidade.

Essa “arte ou poder de conduzir o povo” leva-nos a lugares comuns. Não é necessário criar-se um “Gabinete de Crise para Refugiados” com tanto alarido, pois a verdadeira filantropia faz-se em silêncio.

Já na Grécia Antiga se praticavam (não em sua plenitude) estratégias de condução político-ideológica, que se amparavam em balelas apelativas, emocionais ou irracionais, em vez de raciocínios lógicos e verdadeiros.

Abraham Lincoln (1809-1865) vem em meu auxílio apontando-me qual a decisão acerca da minha dúvida inicial em epígrafe. Sendo ambas as possibilidades pouco abonatórias, decido, assim, que, no presente caso, se trata da primeira, pois, e como nos diz o célebre político, “a demagogia é a capacidade de vestir as ideias menores com palavras maiores”.

Comentários

Armando Taborda disse…
Não comento, porque contra o medíocre oportunismo político não há argumentos.

Mas sempre te digo que, no mundo das 30 guerras versus guerra dos 30 anos, os governantes internacionais ainda não se interessaram nem decidiram pela paz universal. Costuma dizer-se que o objectivo maior da política é a felicidade da comunidade humana. Como isso está longe, prova-se que a democracia eleitoralista não funciona. Será difícil que os verdadeiros estadistas se candidatem porque a política não os seduz. Onde estão as personalidades internacionais com perfil e vontade de reconstruir a humanidade? E se aparecerem, quem lhes dá o poder? E se o assumirem, quem as vai aceitar?

Ainda uma nota final sobre a diferença do acolhimento aos refugiados, os ucranianos são melhor recebidos porque são caucasianos, monoteístas, e para chegarem à Europa não precisam morrer afogados no Mediterrâneo.

Mensagens populares deste blogue

Um jardim para Carolina

Revolucionária e doce. O que mais posso dizer de ti, minha querida Carolina? Creio que poucos extravasaram tão bem, tão literariamente, tão poeticamente, as suas apoquentações políticas. Vivias num estado febricitante de transbordamento emocional, que o digam os teus textos – aflitos – sobre as questões sociais ou, no mais puro dos devaneios sentimentais, as tuas observações sobre a música que te apaixonava. O teu perene estado de busca pelo – quase – inalcançável, fazia-nos compreender como pode ser importante a fortaleza de uma alma que não se verga a modismos ou a chamamentos fúteis vindos de seres pequenos. E por falar em alma, a tua era maior do que o teu corpo, por isso vivias a plenitude da insatisfação contínua. Esse espírito, um bom daemon , um excelente génio, que para os antigos gregos nada mais era do que a Eudaimonia , que tanto os carregava de felicidade, permitindo-lhes viver em harmonia com a natureza. Lembro-me de uma conversa ligeira, onde alinhava

Obrigado!

  Depois de, aproximadamente, seis anos de colaboração com o Jornal das Caldas, chegou o momento de uma mudança. Um autor que não se movimenta acaba por cair em lugares-comuns. O que não é bom para a saúde literária da própria criação. Repentinamente, após um telefonema recebido, vi-me impelido a aceitar um dos convites que tenho arrecadado ao longo do meu percurso. Em busca do melhor, o ser humano não pode, nem deve, estagnar. Avante, pois para a frente é o caminho, como se costuma dizer, já de modo tão gasto. Sim, estou de saída. Deixo para trás uma equipa de bons profissionais. Agradeço, a cada um, pelos anos de convívio e camaradagem. Os meus leitores não deverão sentir falta. Mas se por acaso isso vier a acontecer, brevemente, através das minhas redes sociais, saberão em que folha jornalística estarei. Por enquanto reservo-me à discrição, pois há detalhes que ainda estão a ser ultimados. A responsabilidade de quem escreve num jornal é enorme, especialmente quando se pr

O Declínio das Fábulas - I

  Em poucos dias, o primeiro volume do meu novo livro “O Declínio das Fábulas” chegará a todas as livrarias portuguesas. Esse tomo reúne uma série de temas que reverberam o meu pensamento nas áreas da cultura, da arquitetura, da mobilidade, etc. para uma cidade como Caldas da Rainha. O prefácio é de autoria da jornalista Joana Cavaco que, com uma sensibilidade impressionante, timbra, assim, o que tem constituído o trabalho deste que vos escreve. Nele, há trechos que me comoveram francamente. Outros são mais técnicos, contudo exteriorizam um imenso conhecimento daquilo que venho produzindo, por exemplo: “É essa mesma cidade ideal a que, pelo seu prolífico trabalho, tem procurado erguer, nos vários locais por onde tem passado, seja a nível cultural ou político. Autor de extensa obra, que inclui mais de sessenta livros (a maior parte por publicar) e um sem fim de artigos publicados em jornais portugueses e brasileiros, revistas de institutos científicos e centros de estudos, entre o