Clementina Maria Ferreira de Jesus (1890-1977), minha bisavó, pela linhagem paterna, nasceu em A-da-Gorda, Óbidos.
No ano do seu nascimento Albert
Einstein (1879-1955) formou-se em Física e Matemáticas na Politécnica de
Zurique; Em Angra do Heroísmo, Açores, ocorreu a Aclamação de D. Carlos I (o
Diplomata, 1863-1908); “Monkeyshines nº 1” (uma produção experimental do Edison
Studios, de propriedade de Thomas Edison (1847-1931)), sob direção de William
K. L. Dickson (1860-1935) e William Heise (1847-1910), torna-se o primeiro
filme estadunidense; É executada,
pela primeira vez, num sarau lisboeta, a composição que se tornaria (em 1911) o
Hino de Portugal: “A Portuguesa”, com letra de Henrique Lopes de Mendonça
(1856-1931) e música de Alfredo Keil (1850-1907); O “Hino Nacional do Brasil”,
cuja melodia é de autoria de Francisco Manuel da Silva (1795-1865), é
oficializado; Morre o pintor neerlandês Vincent van Gogh (1853-1890) e o
escritor Camilo Castelo Branco (1825-1890).
Na literatura, a Língua Portuguesa
é distinguida, entre outros, pelo surgimento de “Correspondência de Fradique
Mendes” e “A ilustre casa de Ramires”, de Eça de Queiroz (1845-1900) e “Dom
Casmurro”, de Machado de Assis (1839-1908).
1890 foi, também, o ano do
“Ultimato britânico”, um “memorando” que exigia que Portugal retirasse os
militares, comandados por Serpa Pinto (1846-1900), de todo o território
(atualmente Zâmbia e Zimbabwe) existente entre as colónias de Angola e
Moçambique, sob justificação de, se o não fizessem, ocorrer um grave incidente
entre os portugueses e os macololos, uma numerosa tribo autóctone da região do
Alto Zambeze.
Todos os episódios iniciados
pelo surgimento desse Ultimato cunharam o desenvolvimento da política nacional,
entre eles o que levou ao fim da Monarquia constitucional e à implantação da
República (1910).
Por aquela época, enquanto Lisboa fervilhava, especialmente por motivos políticos, em A-da-Gorda a vida corria na mais suave normalidade. Os ecos tumultuosos que ali chegavam não afligiam os moradores da aldeia, na sua maioria monárquicos, católicos e agricultores, que viviam o dia-a-dia na alegria da entreajuda e na bênção da fraternidade familiar. Eram, segundo consta, extremamente supersticiosos, tanto que “conduziam sempre os mortos pela rua Direita e os batizados e casamentos pela rua de baixo”.
As cerimónias religiosas
aconteciam na Capela de Santo António, situada no centro da aldeia, na praça
com o mesmo nome. Um templo em estilo barroco, de planta longitudinal, com nave
única e galilé, construído no século XV, internamente revestido a azulejo -
aplicado no correr do século XVII - tendo, no século XVIII, assentada a talha
dourada no altar-mor e nos altares laterais, porém, a sua maior riqueza são as
telas de autoria de Josefa de Ayala (1630-1684) e de Baltazar Gomes Figueira
(1604-1674).
Conheci a minha bisavó,
Clementina Maria Ferreira de Jesus, em maio de 1975, quando cheguei a Portugal.
Dela, tenho deliciosas recordações, contudo, há uma lembrança que muito me
enternece: ela, sentada na sua cadeira de balanço, tendo ao colo, afofado em
uma manta, o seu gato de estimação. Rememoro muitas das nossas conversas, do
seu contentamento por nada faltar à família, da sua paixão pela sua terra e
pelas suas gentes. Recordo-me, também do seu amor pelos animais. Com certeza,
agora, é um espírito tranquilo e completo.
“Dentre todas as sociedades,
nenhuma há, mais nobre e mais estável, do que aquela em que as pessoas estejam
unidas pelo amor” (Cícero, 106 a. C.-43 a. C.).
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