O
meu pai nasceu no ano de 1931 em A-da-Gorda e, poucos dias depois, foi batizado
na Igreja de Santa Maria.
Óbidos
era, por aquela altura, uma vila menos turística e mais atenta às questões
religiosas, por isso, creio, existia um halo de magnificência ao redor daquele
templo. Os naturais da terra – e muitos de outras plagas – percorriam as
igrejas obidenses com um devotamento que impressionava, mas, era em Santa Maria
que mais se demoravam.
Era
uma época diferente. António de Oliveira Salazar (1889-1970) ocupava a cadeira
de ministro das Finanças, e dois anos depois seria plebiscitada uma nova
Constituição, dando, assim, início ao Estado Novo.
Rezam
as crónicas antigas que a Igreja de Santa Maria (ou Igreja Matriz de Óbidos)
fora sagrada em 1148 por D. Afonso Henriques (1109-1185), logo após a conquista
da Vila. Este monarca, com o apoio de cruzados do norte da Europa, conseguiu
conquistar Lisboa aos Mouros no ano anterior e, numa sucessão de vitórias, foi
alargando as fronteiras territoriais, de todo o torrão que herdara.
Após
a consagração do templo, São Teotónio (1082-1162), prior do Mosteiro de Santa
Cruz em Coimbra e amigo de D. Afonso Henriques, recebe a incumbência de ali
gerir um priorado simples.
Essa igreja foi, também, sede de uma Colegiada - semelhante
ao Cabido de uma Sé Catedral, possuidora, portanto, de um conjunto de cónegos
com dignidades e ofícios –, extinta aquando da legislação liberal em meados do
século XIX.
O
edifício, auferindo, com o passar dos séculos, um conjunto de melhoramentos e
ampliações, chegou aos nossos dias sobraçado em elementos de diversos estilos:
Manuelino, renascentista, maneirista e barroco.
Possuidor
de uma riqueza pictórica e azulejar ímpar, está classificado como Imóvel de
Interesse Público de Portugal, e fica situado, como sabem, dentro das muralhas
do Castelo de Óbidos, este qualificado como Monumento Nacional.
O
meu pai muito percorreu aquele largo defronte da Igreja, e eu, por tantas e
tantas vezes, por ali passo para saudar a memória dos meus antepassados
obidenses.
D.
Afonso Henriques deve ainda pairar, juntamente com as suas hostes, por aquele
períbolo, embora - como nada resta do edifício que conheceu, pois a antiga
estrutura foi totalmente modificada, no início do Séc. XVI, por ordem da Rainha
D. Leonor de Lencastre (1458-1525) – deva estar impressionado, por ter diante
de si uma Igreja imponente e vetusta, que enche de orgulho os naturais da terra.
Imagino o seu olhar de admiração. Percebo o seu contemplar pelo entorno, a
coscuvilhar as emoções mais íntimas da sua bruta alma. Um espírito elevado na
rudeza da lâmina. Certo de que é, foi e será o grande guardião de todo aquele
território e, em particular, daquele templo. Um monarca que talvez não entenda
a importância dos artistas João da Costa (Séc. XVIII) e Josefa de Ayala
(1630-1684), mas, certamente compreende o significado da “Anunciação” ou do
“Batismo de Cristo”, pois a sua espada sempre esteve ao dispor da sua religião.
Hosanas
à Igreja de Santa Maria. Que ultrapasse, de pé, os séculos adiante.
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