Sempre achei o Centro de Artes
das Caldas da Rainha um local muito atraente, porém, sem conexão entre os
espaços museológicos e sem nenhuma relação com a comunidade onde está inserido.
Essa estrutura, tutelada pelo
Pelouro da Cultura, foi criada para resguardar o património artístico municipal
e para apadrinhar o crescimento dos criativos de todas as vertentes das artes
plásticas, mas ainda não atingiu o seu ponto de ebulição.
São diversos os motivos que me
fazem pensar assim, porém, destaco apenas dois: Uma grande parte da classe
política (claramente avessa à cultura) desconhece por completo quais os museus
que o compõem; Uma boa parcela da população não faz a mínima ideia da sua
existência, nem nunca deve ter reparado em nenhum dos museus ali inseridos.
Aquele núcleo é fundamental
para Caldas da Rainha, sendo, inclusive, o real depositário de um dos mais
importantes, e expressivos, fundos de escultura portuguesa do século XX.
Nesse sentido, a requalificação
da Casa Amarela (ou Quinta da Saúde, para os mais antigos) é uma mais-valia no
quesito da recuperação do património arquitetónico de uma época específica e,
também, porque pode “organizar” a mente dos caldenses, levando-os a perceber
quais os museus existentes no local, de que modo podem usufruir de cada um, e
qual o rosto artístico-educativo desta região.
Nas páginas deste jornal
cheguei a explanar sobre a Identidade Cultural das Caldas da Rainha (1 de
agosto de 2018), bem como sobre a necessidade deste concelho possuir um Plano
de Recuperação Patrimonial (23 de setembro de 2020), o que se apresenta (de um
modo ainda mínimo) com a requalificação da Casa Amarela, cuja fachada ostenta,
felizmente, o traço que a caracterizou.
A partir desse imóvel poderá o
caldense, e o turista, percorrer os espaços museológicos ali inseridos: O
“Atelier-Museu António Duarte”, detentor de um excelente acervo desse
mestre-escultor (não esquecendo a magnitude do conjunto de Arte Sacra, que nos
apresenta peças desde a Alta Idade Média até ao período Barroco); O “Atelier-Museu
João Fragoso”, abrigo de uma parte excelsa da sua obra figurativa, abstrata e
conceptual, tanto em escultura quanto em desenho, pintura e cerâmica; O “Museu
Barata Feyo”, também um abrigo das obras de seu patrono, admirável professor da
Escola de Belas-Artes do Porto, escultor e ensaísta. São notáveis as suas
peças, tanto na escultura oficial quanto na religiosa, bem como os seus
retratos; O “Espaço Concas”, dedicado a Maria da Conceição Nunes, e que possui
um expressivo agregado pictórico desta artista; O “Museu Leopoldo de Almeida”,
com obras de pequena e média dimensão (com 285 esculturas e quase 900
desenhos). Este criador é um dos grandes nomes do Estado Novo, sendo o autor,
por exemplo, das esculturas do Padrão dos Descobrimentos em Lisboa, da de Eça
de Queirós na Póvoa do Varzim, e da de Ramalho Ortigão, no Jardim das Chagas,
no Porto.
Com a requalificação da Casa
Amarela abre-se uma porta para a efetiva organização daqueles espaços
museológicos, além de ser um excelente apoio técnico para a residência de
artistas e estudantes que possam deslocar-se a este concelho para aprimorar os
seus estudos nas mais variadas temáticas das artes plásticas.
Caldas da Rainha (ou outro
concelho fora do eixo Lisboa-Porto) dificilmente chegará, em criação, aos pés
de Montmartre, mas quem sabe o espírito dos que desfilaram o seu talento nesse
deslumbrante bairro parisiense possa respingar por estas bandas. Um concelho
que ignora José Malhôa jamais compreenderá um Renoir, um Picasso, um
Modigliani, um Van Gogh, etc.. Mesmo
assim, a esperança sobreviverá. Tem de sobreviver.
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