Feliz daquele que teve a
oportunidade de sentar-se no colo dos avós. Em minha modesta opinião, acredito
que a convivência com os pais dos nossos pais deixa no coração, na alma, e na
mente, uma infinitude de generosidade, além de proteger-nos de ataques de
depressão e ansiedade, podendo, inclusive, ajudar-nos a ter autoestima,
discernimento emocional e melhor desempenho escolar.
Dependendo do temperamento dos
avós, podemos abraçar causas sociais; defender opiniões clubísticas, quiçá
políticas; compreender quem somos; aprender a história da nossa família;
ampliar a nossa impressão de conforto e segurança; pedir as coisas mais
estranhas para comer; empanturrar-nos de mimos, de beijos e de abraços; ou
seja: criar memórias que guardaremos por toda a nossa existência.
Quem nunca os teve, não sabe o
que perdeu. Quem já não os tem sabe muito bem a falta que fazem.
Nos dias que correm, as crianças e os
adolescentes não têm tempo para lhes dar atenção (e receber em troca o exemplo
mais profundo do que é o amor). A tecnologia, que veio para melhorar, e
estreitar, a comunicação entre pessoas e países, encarregou-se de levantar um
muro, visivelmente intransponível, entre essas gerações. Com isso, os mais
jovens ficarão emocionalmente pobres, insensíveis para o que os rodeia, e com
um vazio interior que, mesmo que gastemos toda a nossa saliva em romanescas
explicações, nunca conseguirão compreender qual a causa.
Os avós são os indivíduos com quem se
estabelece um vínculo mais significativo e duradouro. Com certeza, os grandes
responsáveis pelo nosso desenvolvimento psíquico e social, ou seja, podem ser
as pessoas mais importantes na construção da nossa identidade.
Possuo uma lembrança perene, emotiva, saudável
e nostálgica dos meus avós. Lembro-me deles diariamente. A cada dia que nasce,
antes dos afazeres profissionais, olho para os seus rostos (nas fotografias que
estão a poucos palmos de distância da minha mesa de trabalho) e beijo-os,
mentalmente, com ternura e saudade.
Admiro a coragem que tiveram, especialmente
para enfrentar os difíceis e nebulosos anos do Estado Novo, onde as docilidades
eram poucas, e muito o “trabalhar para o bem da nação, em troca de meia
sardinha e um naco de pão”.
Apesar das intempéries diárias, a alegria, a
força descomunal da sua têmpera, e a robustez das suas almas, ajudaram a alterar,
para muito melhor, o destino das gerações seguintes.
Hoje, na minha vida, aquilo que um dia conheci
como “família” já não existe. Quando desapareceram os luminares que nos guiavam,
perderam-se, também, os laços íntimos que nos uniam. Tudo desmoronou. Provavelmente,
não havia amor entre nós. Apenas conveniências.
Aos meus avós, ninguém lhes roubou a infância
e a adolescência. Embora tivessem de trabalhar duro desde tenra idade, foram
passando pela vida, sem permitir que a vida transcorresse brusca e ferozmente
por eles. Nesse caminhar conviveram salutarmente com os seus ascendentes,
mantendo e ampliando os laços que vinham de distantes gerações. Foram
emocionalmente presentes na minha vida.
Era rotina diária, devido à nossa extrema
amizade, falarmos acerca de tudo, inclusive de sentimentos e emoções, e é nessa
senda que deixo o coração extravasar um pensamento de autoria de Leal de Sousa
(1880-1948), praticamente uma divisa, anunciadora da galhardia e da magnanimidade
de cada uma daquelas almas: “Minhas
avós foram formosas. E meus avós foram heróis”.
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