Atualmente, o ato de consumir
define aquilo que conhecemos como felicidade. Poucos são os que admiram o por
do sol ou o deslumbre do seu nascimento. O humano atual não olha para o céu, ou
acima da linha do horizonte, a sua visão estanca na altura do umbigo, o que o
faz pensar pequeno, quase rasteiro.
Se o indivíduo reside numa urbe
cuja vida noturna é completa, com acesso a salas de cinema, concertos musicais,
teatro, espetáculos de dança, exposições pictóricas, escultóricas e/ou
fotográficas, lançamentos de livros, etc. inevitavelmente há uma maior
interação e um interessante “aproveitar o momento que se vive”, logo, existe
vontade de “esticar”, sair dos eventos e frequentar um estabelecimento que
encante o estômago ou um local propício a “abanar o esqueleto”. A vida que se
apresenta diante de nós é que nos torna diferentes, mais comunicativos, pouco
egoístas e rancorosos, menos propensos e destilar venenos. A nossa felicidade
deveria, portanto, passar, indeclinavelmente, por atos de preenchimento da alma,
não apenas pelo prazer de consumir futilidades.
Quando vivemos em concelhos que
possuem ofertas culturais de grande monta, todos os dias da semana, a nossa
disposição para encarar as questões do dia a dia é elevadíssima, permitindo que
paremos de dizer a tosca frase “Um dia serei feliz”. A felicidade deve existir
no imediato, todos os dias. Se acreditarmos que no futuro é que seremos
felizes, evidentemente teremos um presente péssimo, logo, não existirá
contentamento no porvir. Agora é o momento. Buscar o senso de propósito e de
realização só é permitido no segundo que se vive, pois daqui a um minuto será
tarde.
O ser humano de hoje mostra-se
muito ocupado com “imensas, e importantíssimas” tarefas a realizar. As pessoas
estão a enganar-se, pois nada do que produzem é importante, pois não é para o
agora. Não é luz para a humanidade. E é, geralmente, algo imposto por uma
sociedade doente, que nos quer obrigar a seguir por trilhos pouco confiáveis,
que levam escassa satisfação à nossa alma e muito dinheiro ao bolso dos
manipuladores.
Encontrar a felicidade plena, e
morar dentro dela, é para poucos. E causa uma inveja aterradora, pois a ventura
caustica, encoleriza os de raciocínio minúsculo. Expõe-lhes a ignorância.
Reduz-lhes o ato de ponderar. E aumenta-lhes o dom de ser carneiro, seguidor de
metáforas.
Pensar é o segredo para
alcançar metas longínquas, porém, primeiro, convém parar com todos os vícios de
acumulação de frivolidades. Cobrar incessantemente, dos órgãos autárquicos, uma
melhoria em todos os setores que são alavancas da sociedade (cultura, educação,
saúde, etc.) e apontar-lhes o dedo quando nos querem impingir entretenimentos
bacocos é nossa obrigação. Estar atento ao que nos rodeia dá trabalho, mas pode
ser o mote criador de um futuro melhor para os nossos filhos e netos.
Uma sociedade evoluída não
solta fogos de artifício por causa da abertura de um novo bar. O surgimento de
um estabelecimento desse tipo deve ser encarado como algo que pode permitir a
exploração de um prazer, a degustação, não como um novo paradigma cultural.
Se
a pessoa habita num concelho como Caldas da Rainha, cuja vida noturna é
paupérrima – basta apreciar o vazio do centro da cidade após as 21 horas, no
verão, para o comprovarmos -, fica-nos a sensação de que as mentalidades do
lugar estão mais vocacionadas para o parasitismo, incentivadas por miseráveis e
erróneas políticas culturais imputadas à região. Logo, esses seres humanos dão
mais atenção ao umbigo do que à linha do horizonte.
Bertolt
Brecht (1898-1956) atira-nos à cara: “Fôssemos infinitos, tudo mudaria. Como
somos finitos, muito permanece”. Dentro da nossa pequenez perpetuamos o frívolo,
incentivamos a busca pelo oco, alardeamos o óbvio. A maioria de nós será
sepultada sem ter adubado uma realização palpável, que orgulhe os nossos
descendentes. Inúmeros - como é o caso da maioria da classe política atual -
por muito que paguem para estarem em destaque, serão esquecidos. Graças a Deus!
E, que venham pessoas de saber imensurável e de alma pura.
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