Avançar para o conteúdo principal

Fonoteca Municipal das Caldas da Rainha


Existem memórias que nunca deveríamos perder, uma delas, a meu ver, está relacionada com os discos de vinil que alguns de nós ainda possuem.

Não há no concelho um grande especialista em discos nesse suporte, o que temos são curiosos, que despejam uma série de informações mal-amanhadas, e que conseguem, talvez devido ao volume com que propagam as barbáries, fazer-se ouvir.

Baseando-me em conversas com alguns amigos de Lisboa, autoridades absolutas no que trata ao vinil, lembrei-me de escrever acerca dessa paixão, e das Caldas da Rainha.

Decidi fazê-lo, também, para tentar sensibilizar os autarcas para a criação de uma Fonoteca Municipal, um local onde poderíamos arquivar, tratar e disponibilizar para audições, diversas coleções que jazem espalhadas por inúmeras coleções e que, antes de serem atiradas ao lixo, após a morte dos seus proprietários, pudessem ser mais uma riqueza cultural do concelho.

Zero Freitas, o conhecido empresário brasileiro José Roberto Alves Freitas (1955), é atualmente o maior colecionador de discos de vinil do Planeta. O seu acervo ultrapassa os SETE milhões de discos. Este homem, conhecedor do bem que possui, quer criar um espaço público na cidade de São Paulo para que qualquer pessoa possa usufruir de sua magnífica coleção. O que reflete um profundo amor pela sua terra e pelo seu património.

De norte a sul de Portugal há coleções particulares muito interessantes, tanto em volume (algumas atingem os 40 mil exemplares) quanto em qualidade. Nas Caldas da Rainha não há coleções impactantes, o que não é impedimento para criar-se uma Fonoteca.

Lembrando que essa Casa de Cultura poderia, evidentemente, ser, também, o repositório de outros formatos, nomeadamente o DVD e o CD. Além disso, seria possível desenvolver diversas atividades, oficinas musicais e ações distintas de animação cultural, para os mais diferentes públicos.

A criação de um espaço lúdico, relacionado com a música, numa área dedicada às crianças, seria um modo de aproximar a juventude de sonoridades que estão muito além daquilo que podem receber via Internet, além de existir a possibilidade desse espaço ser um polo de apoio aos Conservatórios de Música, deste e dos concelhos vizinhos.

Outra vertente que tal projeto pode possuir: A criação de um estúdio de gravação e de pós-produção de áudio, câmara de eco, anexos para a realização de voz off, acabamentos musicais, restauração de suportes, etc., mais-valias para os músicos da região Oeste.

Evidentemente, seria necessário um método basilar e ativo, no sentido de atrair público e, principalmente, de doação de acervos, um trabalho a ser desenvolvido com muita seriedade, para que não seja mais um arquivo morto, como outros existentes no concelho.

Preencher os campos funcionais, temáticos e históricos, para ressaltar a missão dessa entidade, fixando-a para a posteridade, é um trabalho deveras interessante, e que só poderá ser desenvolvido por pessoas da área musical, e não por comissários de cartola, que despejam frases sensaboronas, ao sabor de uma maré ultrapassada. Se Caldas da Rainha não possuísse uma plateia culturalmente leiga (deve ser um mal geral no país) certas mentalidades bacocas já teriam regressado ao sarcófago.

Finalizando: Uma fonoteca municipal trará ao concelho uma evidência ímpar, principalmente se verificarmos que em Portugal existem apenas duas, a de Lisboa e a do Porto.

Diagnosticar a música, em qualquer género, desde os primórdios, é possível, bastando, para isso, evidenciar uma reflexão acerca da importância de proteger acervos. A existência da Fonoteca Municipal das Caldas da Rainha será o grande contributo nesse sentido. Como o será também para identificar o público ouvinte, mostrando ao futuro qual o calibre das gentes oestinas.

---

Imagem: Fonoteca Municipal de Vinil da Câmara do Porto.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

José Rui Faria de Abreu

  Existem amigos que, quando partem para os confins do Desconhecido, nos deixam uma lacuna na alma, difícil de preencher. Foi o caso do Faria de Abreu. O primeiro contacto que tive com ele foi em Coimbra, no ano de 2001, quando fui obrigado a levar o meu pai, em consulta oftalmológica, de urgência. Após aquele dia, travamos uma salutar amizade, com vários telefonemas em diversos períodos nos anos que se seguiram, e até inúmeras visitas aquando das minhas várias passagens pela Terra dos Estudantes. Os colegas diziam que ele era o melhor oftalmologista de Portugal, a Universidade de Coimbra tecia-lhe elogios e louvores, os pacientes – o meu pai incluído – diziam que ele era um médico respeitador e dedicado. Eu digo, simplesmente, que ele era uma figura humana sensível, logo, alguém que compreendia o valor da amizade. José Rui Faria de Abreu faleceu na manhã do dia 27 de novembro de 2012 no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra , aos 67 anos de idade,...

Arena Romana nas Caldas da Rainha

Toda a vez que ouço um aficionado das touradas destilar frases de efeito, anunciando que “aquilo” é cultura, ponho-me a pensar num excelente projeto que poder-se-ia executar nas Caldas da Rainha: Construir-se uma Arena Romana. Naturalmente seria um plano muito interessante do ponto de vista “cultural”. As Arenas Romanas estão na história devido à inexorável caçada suportada pelos cristãos primitivos. Praticamente a mesma coisa que acontece com os touros numa praça. São muito conhecidas as crónicas sobre as catervas de animais impetuosos que eram lançados sobre os fiéis indefesos, algo muito semelhante com o que se vê nas liças tauromáquicas. Um touro a mais ou a menos para os aficionados é, praticamente, igual ao sentimento romano: Um cristão a mais ou a menos pouco importa. O que vale é a festa; a boa disposição de quem está nas arquibancadas; as fortunas envolvidas, representando lucros fenomenais para alguns; a bandinha de música, orientada por um maestro bêbad...

A arte de Paulo Autran

  Um dos amigos de quem sinto mais saudades é esse Senhor, cujo nome está em epígrafe. O seu percurso profissional mistura-se com a história do teatro brasileiro. O seu talento ombreia com o das divindades dos palcos, Leopoldo Fróes (1882-1932) e Laurence Olivier (1907-1989). A sua postura era ímpar, a de um cavalheiro, praticamente um aristocrata. Estava com 25 anos de idade quando o conheci, um ser ainda imberbe. Ele, com simpáticos 68. Gigante há muito. Respeitado, cultuado, um exemplo. Era carioca, nasceu na cidade do Rio de Janeiro, numa quinta-feira, 7 de setembro de 1922. Muito influenciado pelo pai, Walter Autran (1891-1960), formou-se na Faculdade de Direiro do Largo de São Francisco, em 1945, desejando abraçar carreira na diplomacia. Não almejava ser ator, porém estreou como amador, em junho de 1947, no Teatro Municipal de São Paulo, com a peça “Esquina Perigosa”, de autoria de John Boynton Priestley (1894-1984), com direção de Silveira Sampaio (1914-1964). Infl...